Aluguei o sótão a um inquilino.
Sim!
Sem saber, quase sem sentir ou sequer pressentir, aluguei o sótão a um inquilino.
De repente e por acaso, puro acaso de uma dessas curvas da vida que nos marcam a existência, dei comigo a constatar a existência plena e ribombante de um inquilino a quem tinha alugado o sótão.
- Como?
- Sei lá como! Nem sequer tinha noção que tinha sótão quanto mais inquilino!
Quer dizer, esta de dizer; nem sequer tinha noção que tinha sótão é relativo exagero.
Claro que toda a gente tem sótão e eu também.
É no sótão que vamos guardando ao longo da vida as coisas a que damos importância, coisas importantes num determinado momento, noutro nem tanto, mas importantes afinal.
Passamos largos períodos da vida amealhando e arrecadando no sótão.
Por vezes, damos connosco no sótão a vasculhar as coisas arrecadadas, relembrando, recordando, qual filme, todo o percurso que fomos palmilhando, umas vezes sós, outras acompanhados pelos que amamos.
E sorrimos, claro que sorrimos no vislumbre colorido de vidas já vividas.
Normalmente o sótão está tão ocupado que já não cabe lá mais ninguém.
Ora, aqui é que está o gato!
O enigma!
Era suposto não existir inquilino. Pois é, mas o inquilino existe e está lá.
- E quem é este inqulino, tem nome?
- Sei lá eu, acho que sim, tem um nome estranho que termina em oma, sei lá.
- Vive só?
- É pacato e discreto, ou é um desses que leva a vida numa roda viva de convivas, festas e festanças sem se preocupar com os outros?
- Tem família?
- Família estável ou das que se vão multiplicando e desmultiplicando contínua e descontroladamente absorvendo e anulando todos os outros?
Pelo que me dizem, amigos que já o conhecem de outras andanças, outras festas e festanças, este inquilino gosta de viver só.
É sereno, pacato e vive fechado em si mesmo sem dar cavaco a ninguém ao seu redor.
Ah, malandro!
Não deixas de ser um penetra, penetra despropositado, deslocado e inconveniente.
Do mal o menos.
Inquilino por inquilino que sejas assim, discreto e amorfo.
Que para viver estou cá eu, estamos cá nós!
Com inquilino ou sem inquilino!