... algures na costa portuguesa mesmo a sul da foz do rio Mondego.
Era, como se dizia então, um bom pesqueiro. Havia fartura de pescado e as artes, ainda novas e de não fácil manuseio, vinham carregadas até á vergueira
... algures na costa portuguesa mesmo a sul da foz do rio Mondego.
Era, como se dizia então, um bom pesqueiro. Havia fartura de pescado e as artes, ainda novas e de não fácil manuseio, vinham carregadas até á vergueira
Aproxima-se o dia em que a merecida homenagem ao homem do mar da Cova-Gala, personificado na figura do pescador de bacalhau à linha, vai ter lugar.
Será, decerto, um Bom Dia.
Apesar de o motivo e o modelo escolhido, que não a idéia, ser fruto de névoas e brumas escusas de pelágicas desconfianças, ao invés da clara participação na escolha, aberta e universal, onde todos os covagalenses interessados pudessem ter tido legítimo lugar ... vai ser um Bom Dia!
Mesmo que a estética do elemento escultórico escolhido seja ...mais assim, ou ... mais assado, será SEMPRE um bom dia.
Mesmo que os eleitos, eventualmente, não consigam libertar-se das grilhetas da presunção e dos pressupostos politicos, ... será sempre um BOM DIA!
E, aqui, na COVA-GALA, - povoado que proclama bem alto a sua identidade assente em raízes da Cova, da Gala, do mar que nos banha e de todo esse, outro mar, onde os seus homens consolidaram uma história de trabalho e de grandeza - esta homenagem ganha uma legitimidade ímpar.
A cidadania e a sintonia com estes valores faz-nos querer participar. Tentando ajudar a entender as "grilhetas da presunção e dos pressupostos politicos", (quando a mesma é rasteira), conforme assistimos há um mês atrás em Lavos e, a um outro tempo, enaltecer a legitima e verdadeira homenagem a ter lugar na Cova-Gala.
Com a preciosa ajuda do Museu Marítimo de Ilhavo é possivel provar que a grande , a esmagadora maioria dos pescadores do bacalhau, nascidos em Lavos, são oriundos e naturais da Cova e da Gala.
Começamos, hoje, a publicar as cédulas maritimas dos nossos antepassados.
Por razões de "peso digital", ou de próprias limitações técnicas, somos obrigados a dividi-las em várias apresentações.
Nem imaginam o quanto e porque concordo com esta frase que está, aliás, registada e gravada a bronze num elemento escultórico no largo da Alminhas.
Nos primeiro tempos da fundação os homens da Cova amanharam o mar nas árduas lides das artes da praia (modernamente designada xávega).
Desde as últimas décadas do século XIX e até meados do século XX temperaram com o sal do mar do Atlântico norte o suor desse esforço insano, que foi a epopeia da pesca do bacalhau à linha.
Na frota da Figueira da Foz as companhas dos esbeltos lugres bacalhoeiros eram, na sua grande maioria, compostas por homens da Cova e da Gala.
Longos meses vogando em alto mar entregues a si próprios na solidão dos dóris, sentindo no rosto o afago amargo da surriada, temendo pelo inebriante e desorientador nevoeiro da Terra Nova e Gronelândia, perspectivavam a viuvez das mulheres e a orfandade dos filhos.
Por tudo isto, unanime e orgulhosamente aceite pela população da freguesia de S. Pedro, se justifica que, há mais de doze anos, exista o projecto de perpétuar, em elemento escultórico, (vulgo estátua) a mémória do homem do mar da Cova-Gala.
A verdadeira homenagem a este homem do mar é na freguesia de S. Pedro que deve ter lugar!
Com a dignidade que os nossos antepassados merecem!
Tenho receio que tal dignidade seja conspurcada pelos interesses de ocasião que os anos eleitorais são ávidos em proporcionar.
O facto desta homenagem, - que vai ser paga por TODOS NÓS ao contrário do que alguns pensam, - estar a ser tratada e gerida nos confins dos segredos mais envergonhados e nas brumas de complexos temores de pelágia desconfiança, não augura nada de bom.
A cultura, se não for partilhada e vivida pelas comunidades a que dizem respeito é e será sempre MENOR.
Como, há quatro anos, foi MENOR a cerimónia do hastear dos símbolos hieráldicos da freguesia de S. Pedro que, por imposição de interesses e negociatas politico-partidário pseudo independentistas, foi transformado num "grandioso e de sucesso" comício de propaganda eleitoral e a que não faltaram, inclusivé, aspectos censórios.
O som do rio revolto ecoa no vulto negro das pedras do molhe recortado pelo branco da espuma da rebentação na barra.
O bater das águas na madeira frágil do bote não deixa ouvir o chapinhar dos remos. Faz questão de mostrar quem manda, o Mondego, e faz-se ouvir, zangado, na noite fria de inverno.
Vulto erecto de oleado vestido segurando a rede, cabelos brancos de amarguras vividas ondulando ao vento. Por entre a chuva fustigada pelo vento vislumbra-se a silhueta do velho pescador do rio, em pé, no bote.
A gélida chuva escorre e serpenteia pelos sulcos das rugas que no seu rosto louvam a força que à má fortuna não cede.
Só a mão forte e calejada se finca num lamento, denunciando um desalento íntimo pleno de amarguras.
Seu companheiro não vê a lágrima furtiva que se mistura com a chuva, no seu rosto.
Com os olhos fixos na rede relembra, qual filme, todo o percurso dos seus anos.
Relembra o pavor do desconhecido quando, ainda menino e pela mão de seu pai, embarcou pró bacalhau.
A dor intensa do gelo da Gronelândia, qual punhal de vidro e aço, que lhe trespassava as mãos ao manejar o "trote", o "pucheiro", a faca, o "trole", a zagaia, o pingalim ou a isca, não foi nada comparada com a vaidade de ser "o primeira linha" ou o melhor escalador.
Relembra a meninice dos filhos. A angústia de, às vezes, os ter ouvido chorar com fome. A ansiedade de só ter conhecido o mais velho já quase com meio ano de idade.
O medo atroz que o fez rogar a Deus implorando que os tornasse a beijar, quando em pleno Atlântico naufragou e, alucinado de sede, os via junto a si dando-lhe forças para não desistir.
As saudades que deles sentiu, quando para a América fugiu. Já não os conhecia quando os viu.
Sua mulher, já velha, soube-lhe a fresca, a nova quando passados anos de separação a tomou. Foi como reviver a fogosidade dos anos da juventude longínqua.
Enterrou bem fundo dentro de si todos os temores da infidelidade traiçoeira que a separação favorece, mas o amor puro não consente.
Ah... Pescador ...
Ainda menino, pró bacalhau embarcaste
Já homem, pela América, fugido, andaste
E no Atlântico um dia naufragaste.
Fortuna, prós teus, sempre procuraste
Riqueza nunca encontraste.
Os teus, jamais esqueceste e sempre amaste
Os amigos, nunca olvidaste
Só de ti pescador, nunca te lembraste.
O rio, negro, furioso, altivo como que a expulsar-te.
O teu rosto sereno e forte todo o teu mundo retractando.