Homens à Beira-Mar
"Em Busca de Mais Mar e Mais Vazio…"
HOMENS À BEIRA-MAR
Nada trazem consigo. As imagens
Que encontram, vão-se delas despedindo.
Nada trazem consigo, pois partiram
Sós e nus, desde sempre, e os seus caminhos
Levam só ao espaço como o vento.
Embalados no próprio movimento,
Como se andar calasse algum tormento,
O seu olhar fixou-se para sempre
na aparição sem fim dos horizontes.
Como o animal que sente ao longe as fontes,
Tudo neles se cala p'ra auscultar
O coração crescente da distância
E longínqua lhes é a própria ânsia.
É-lhes longínquo o sol quando os consome,
É-lhes longínqua a noite e a sua fome,
É-lhes longínquo o próprio corpo e o traço
Que deixam pela areia, passo a passo.
Porque o calor do sol não os consome
Porque o frio da noite não os gela,
E nem sequer lhes dói a própria fome,
E é-lhes estranho até o próprio rasto.
Nenhum jardim, nenhum olhar os prende.
Intactos nas paisagens onde chegam
Só encontram o longe que se afasta,
O apelo do silencio que os arrasta,
As aves estrangeiras que os trespassam,
E o seu corpo é só um nó de frio
Em busca de mais mar e mais vazio.
SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN
1944